Lost in Translation

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quarta-feira, 21 de agosto de 2013

A nossa avó!




Passar uns tempos fora do país é toda uma aventura. Mais acrescento, uma experiência pela qual considero que todos os jovens deviam passar. Infelizmente há um elemento que torna a aventura bem difícil e em Timor este problema é especialmente grave, tendo em conta a distância. Afinal de contas, são apenas 18 500 km! As saudades da família ninguém as tira e são pesadas. Especialmente quando a família está a passar uma situação difícil. É duro sentirmo-nos altamente impotentes quando só queremos estar presentes, ajudar e dar miminhos. A preocupação em saber como estão todos e a vontade apanhar o avião é tamanha! Infelizmente a vida é assim e há coisas que não se podem mudar!
Acordei ontem de manhã com a notícia de que a minha avó tinha desmaiado poucas horas antes e já não a conseguiram reanimar. A internet permitiu-me saber rapidamente da notícia. A diferença horária fez do meu dia um permanente estado de ansiedade a pensar como estariam o avô, o pai, tios, irmãos e primos. Passei o dia a contar as horas e os minutos para lhes poder ligar.
Ao que parece, também o meu pai também estava por estes lados quando morreu o avó Álvaro, meu bisavô. Precisamente nas semanas da ocupação Indonésia, estava o meu pai no Ataúro, impotente a ver a coisa a acontecer. Depois de dada a ordem de recuo das tropas (notícia já de si bem difícil de aceitar, imagino), ainda chega a Darwin e recebe a triste notícia do avô, por carta! Não me serve de consolo saber isto mas dá-me vontade de agradecer aos céus, a existência do telefone e da internet. Ao menos assim, desde que tenha em atenção a diferença horária, a qualquer altura posso falar com todos e ir acompanhando minimamente a situação.
“A avó já estava muito velhinha, está melhor assim”, é o que toda gente diz nesta altura em que não se sabe muito bem o que dizer. Também eu não sei o que dizer, talvez por isso me sinta tão impotente neste lado do mundo. Para mim é mais fácil estar e fazer do que falar. Há também uma outra frase que toda gente diz, “foi uma grande mulher e partiu com uma grande obra feita”. Ora cá está a GRANDE VERDADE! Infelizmente só conheci uma avó, mas para mim essa avó sempre foi um exemplo a seguir, o de uma mulher de armas e de um osso bem duro de roer! No pós-25 de Abril, o meu avô foi saneado. Vendo a família sem sustento, a minha avó não baixou os braços, arregaçou as mangas e dedicou-se à cozinha para sustentar a família. Algo que os primos mais velhos ainda se lembram muito bem, por tantas vezes terem acompanhado as entregas.
Mãe de sete filhos, avó de dezassete netos e bisavó de dois, com a terceira a caminho! Uma avó com muita fé (não largava os seus santinhos nem por nada), muito mundo, um sangue frio que não lembra a ninguém e um casamento de meter inveja até ao casal mais apaixonado.
Não sei em que ano os meus avós casaram mas lembro-me que na festa das bodas de ouro eu ainda tinha tamanho para andar a brincar e a desapertar atacadores debaixo das mesas, portanto já foi há uns anitos! Passados todos estes anos, ainda era bem frequente os netos verem os avós a namorar, de mão dada e a dar beijinhos.
Não imagino os calduços que o pai e os tios apanharam quando eram novos mas nós os netos, pelo menos os mais novos, tivemos a sorte de ter uma avozinha bem amorosa que nos deixava atacar a caixa dos chocolates e das bolachas e beber um copinho de vinho ao almoço, sem ninguém ver, está claro. Nos últimos anos a avó já falava pouco mas não deixava de estar sempre presente e bem atenta ao que se passava à volta, especialmente para pedir chocolates, bolachas e um bocadinho de vinho sem os “grandes” verem. Falava pouco, mas a vontade de continuar a comunicar e estar com a avó era muita e os netos desembrulharam-se em arranjar as suas brincadeiras com a avó. A Maria cantava e tocava viola, a Inês pintava as unhas e enchia a avó de colares e pulseiras, a Mariana mana e a avó, cada vez que se viam, toca de deitar a língua de fora uma à outra. A Matildinha, a Sra. Doutora dos avós tomava conta dos dois, enquanto os restante netos mais novos brincavam, pulavam e gritavam à volta da avó, que aturava tudo isto com um sorriso e com a maior das atenções e paciência.
As saudades já são mais que muitas mas nós vamos olhando uns pelos outros, como a avó nos ensinou!

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